A mágica acabou: agora a IA precisa provar valor

Por Enio Klein

O Hype Cycle 2025 da Gartner traz uma mensagem incômoda: a fase do encantamento com a inteligência artificial está chegando ao fim. Embora as empresas tenham investido pesado em 2024 — em média US$ 1,9 milhão por iniciativa — menos de 30% dos CEOs relatam satisfação com os resultados. Isso revela o distanciamento entre a narrativa de transformação imediata e a realidade do retorno de valor.

No ciclo, os chamados “agentes de IA” ocupam o pico da curva de expectativas. São apresentados como a promessa de autonomia total, mas, na prática, ainda carecem de solidez, segurança e confiabilidade. O próprio Gartner projeta que mais de 40% desses projetos serão cancelados até 2027, reflexo da fragilidade e da falta de maturidade dessas iniciativas. A crença de que processos complexos poderiam ser conduzidos sem supervisão humana permanece, por enquanto, mais próxima da ficção do que da realidade.

Já a IA generativa, que foi protagonista nos últimos anos, inicia sua descida para o “vale da desilusão”. Essa fase, longe de ser um fracasso, faz parte do caminho natural de qualquer tecnologia transformadora: após o hype, vem o confronto com os limites práticos e com a necessidade de ajustes. É justamente nesse momento que se distinguem as organizações que sabem extrair valor real daquelas que apenas surfaram na onda.

Enquanto o discurso ainda gira em torno do espetacular, a infraestrutura invisível começa a se mostrar decisiva. O Gartner estima que os gastos globais em TI crescerão 7,9% em 2025, impulsionados sobretudo por investimentos em bases de tecnologia para suportar a IA. Esse dado reforça que o futuro não está nas promessas chamativas, mas nos alicerces robustos capazes de dar confiabilidade, escalabilidade e sustentabilidade às soluções.

Outro ponto crucial é a governança. Já não é um tema periférico, mas sim uma condição para competir. Ética, segurança, transparência e confiança deixaram de ser acessórios e tornaram-se diferenciais estratégicos. Organizações que negligenciarem esses aspectos enfrentarão não apenas riscos regulatórios, mas também perda de credibilidade junto a clientes e investidores.

O relatório aponta ainda para uma busca por novos modelos conceituais, mais explicáveis e sustentáveis. A percepção é clara: não basta aumentar a escala da tecnologia atual. É preciso repensar combinações de métodos e lógicas que garantam maior confiabilidade e compreensão dos resultados.

Em suma, a mensagem é direta: a fase da mágica fácil acabou. O palco do hype se esvazia, e começa o trabalho que realmente importa — transformar a inteligência artificial em aplicações sólidas, confiáveis e éticas, capazes de ampliar a inteligência humana em vez de substituí-la. Aos conselhos e líderes cabe a tarefa de não se deixarem levar pelo entusiasmo passageiro, mas de investir naquilo que atravessará o vale e sustentará o futuro. Aos acadêmicos: este é o momento de produzir pesquisa aplicada, que ajude a indústria e a sociedade a superar o vale da desilusão com modelos mais explicáveis, robustos e sustentáveis.

O campo está aberto — e o impacto será decisivo.

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