Por Gabriel Ramos de Padua
Durante muito tempo, acreditamos que educação financeira era uma questão individual — algo que cada um devia aprender por conta própria. Mas os tempos mudaram. A complexidade do mercado financeiro, o enfraquecimento do papel do Estado, o excesso de crédito disponível e o custo de vida elevado colocaram os trabalhadores em uma encruzilhada: tomar decisões financeiras difíceis, com pouco ou nenhum preparo. E quem paga a conta? Todos nós, o indivíduo, o governo e, principalmente, as empresas.
Segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE, 2004), a educação financeira é essencial para que os cidadãos consigam tomar decisões seguras sobre sua renda, poupança, investimentos e até para se protegerem de fraudes. Mas o que deveria ser prioridade nacional ainda é negligenciado no Brasil. Enquanto isso, o consumo desorientado e o acesso fácil ao crédito empurram milhões de brasileiros para a inadimplência.
As consequências desse despreparo são visíveis e não se limitam à vida pessoal. Nas empresas, funcionários endividados estão mais ansiosos, improdutivos, ausentes e vulneráveis. Em muitos casos, chegam a pedir demissão apenas para acessar o saldo do FGTS e tentar reorganizar a vida financeira. Essa realidade, documentada por estudos de Braunstein e Welch (2002), mostra que o desconhecimento financeiro impacta não apenas o bem-estar individual, mas também a eficiência do mercado de trabalho e a produtividade das organizações.
O problema se agrava quando observamos que o Estado, historicamente responsável por garantir segurança previdenciária e acesso à educação, já não dá conta de preparar a população para lidar com esse novo cenário. A partir da década de 1990, com a adoção de reformas neoliberais, o Estado brasileiro passou a transferir para os indivíduos a responsabilidade pela própria segurança financeira. A Emenda Constitucional nº 5, de 1998, por exemplo, estimulou os planos de previdência complementar, mas sem oferecer o devido suporte educacional à população (OCDE, 2004).
Nesse contexto, a empresa se torna um agente de transformação. Não apenas como empregadora, mas como uma das poucas instituições que ainda têm contato direto, duradouro e recorrente com o cidadão adulto economicamente ativo. Bernheim e Garrett (2003) já mostravam que a inclusão de programas de educação financeira nas empresas norte-americanas aumentou significativamente a adesão a planos de aposentadoria, como os 401(k)s, plano de aposentadoria patrocinado pelo empregador. Este tipo de plano permite que um colaborador invista parte do seu salário antes da incidência de impostos. Os resultados foram tão positivos que inspiraram movimentos nacionais nos Estados Unidos em defesa da formação de poupança previdenciária.
É claro que os programas corporativos de educação financeira não são uma panaceia. Clark et al. (2006) alertam que, para que a população consiga fazer escolhas corretas sobre poupança e investimento, é necessário um certo nível de conhecimento. E esse conhecimento não nasce do nada. É preciso formação, acompanhamento, orientação contínua. Programas sérios, bem planejados, com linguagem acessível e foco no cotidiano das pessoas e não apenas em teorias abstratas.
A boa notícia é que empresas que fazem isso colhem resultados. Estudos apontam que ações bem conduzidas dentro do ambiente corporativo melhoram a produtividade, reduzem o absenteísmo, diminuem a rotatividade e aumentam o engajamento. Em outras palavras, funcionário com a vida financeira organizada trabalha melhor, fica mais tempo e contribui mais.
A má notícia é que a maioria das empresas ainda não entendeu isso. E seguem, mês após mês, pagando pela improdutividade, pelo estresse, pela desorganização e pelo ciclo vicioso do endividamento silencioso de seus colaboradores.
Se queremos de fato avançar como país e como empresas — não podemos mais ignorar a importância da educação financeira. Não se trata apenas de ensinar a poupar ou investir, mas de capacitar o cidadão para fazer escolhas melhores, mais conscientes e sustentáveis.
Como disse a OCDE em seu relatório Improving Financial Literacy (2005), os países que avançam nessa agenda são aqueles que investem, com seriedade, na formação financeira da população como parte da sua estratégia de desenvolvimento.
A pergunta que fica é: qual o papel da sua empresa nisso? Vai continuar assistindo de fora ou vai assumir a responsabilidade de preparar seu time para vencer dentro e fora do campo da vida?
Gabriel Ramos de Padua