Francisco: o Papa “normal” que encontrou o caminho do coração

José André de Azevedo – Chefe de Gabinete da Reitoria da PUCPR

Após sua primeira viagem internacional, para a Jornada Mundial da Juventude de 2013, na cidade do Rio de Janeiro, em seu retorno à Roma, na coletiva com a imprensa, o repórter Andrea Tornielli perguntou-lhe porque ele mesmo carrega sua bolsa de viagem. O Papa, após brincar, dizendo que não carrega nela a chave da bomba atômica, responde-lhe: “Carrego-a porque assim sempre fiz. É normal. Devemos ser normais. Parece-me um pouco estranho o fato de que a minha foto carregando a bolsa tenha corrido o mundo. Devemos habituar-nos a ser normais, à normalidade da vida”.

Talvez isso seja um dos pontos que nos tenha “entusiasmado” em Francisco: ele foi um papa “normal”. Não que seus antecessores não o tenham sido, mas com Francisco sentimos o ordinário da vida, alguém que era próximo, alguém que estava ao nosso lado no ponto do ônibus, na fila do supermercado, alguém que parecia uma visita calorosa que partilhava conosco a mesa farta e o riso largo. Talvez seja por isso que muitos afirmavam: quando era papa João Paulo II, íamos para Roma para “ver” o papa; quando era papa Bento XVI, íamos para Roma para “ouvir” o papa; quando era papa Francisco, íamos para Roma para “sentir” o papa.

Francisco foi um “papa normal” porque não se autorreferenciava, mas, ao contrário, via e percebia a vida, os gestos e os acontecimentos a partir da Sagrada Escritura. É o que percebemos em seu encontro com os voluntários da Jornada Mundial da Juventude do Rio de Janeiro, no dia de sua despedida: “O serviço que vocês realizaram nestes dias me lembrou da missão de João Batista, que preparou o caminho para Jesus”. É o que sentimos em seu primeiro discurso em terras brasileiras, quando disse a que veio, fazendo referência à conhecida passagem de At 3,1-8: “Não tenho ouro nem prata, mas trago o que de mais precioso me foi dado: Jesus Cristo”.

Francisco foi normal porque conheceu o coração humano, tocando em questões existenciais: “Jesus nos oferece algo superior à Copa do Mundo! Algo superior! Jesus oferece-nos a possibilidade de uma vida fecunda, de uma vida feliz e nos oferece também um futuro”, dizia ele ao povo brasileiro em 2013, às vésperas da Copa do Mundo no Brasil.

O Papa sabia que um pastor lida com pessoas e não com ideias, pois deve se apresentar com ternura e delicadeza e não com imposições: “Aprendi que para ter acesso ao povo brasileiro é preciso ingressar pelo portal de seu imenso coração: por isso, permitam-me nesta hora eu possa bater delicadamente a esta porta”.

A normalidade de Francisco estava em possuir uma linguagem coloquial, partindo da realidade do cotidiano, como nos demonstrou o seu “Tratado Teológico da Solidariedade” baseado em nosso ditado popular de “colocar mais água no feijão”.

O normal da vida, segundo nos ensinou e pediu Francisco, é sermos próximos, ternos, simples, bons ouvintes, ótimos dialogantes, alegres e sorridentes; e isso gera uma cultura da esperança: “Não deixem que lhes roubem a esperança! Não deixem que lhes roubem a esperança! Mas digo também: não roubemos a esperança; pelo contrário, tornemo-nos portadores da esperança!” (Discurso na Visita ao Hospital São Francisco de Assis, Brasil).

A normalidade da existência, a partir das lições do Papa, é que os jovens sejam ouvidos, mas ouvidos a partir de sua própria realidade, como disse Francisco no voo que o trouxe para a Terra de Santa Cruz: “Esta primeira viagem tem em vista encontrar os jovens, mas não isolados da sua vida; eu quereria encontrá-los principalmente no tecido social, em sociedade. Porque, quando isolamos os jovens, praticamos uma injustiça: despojamo-lo da sua pertença”.

Na realidade, a normalidade da missão de um Papa é confirmar os irmãos na fé (cf. Lc 22,32); é normal, então, que Francisco assim tenha feito: “Vim para confirmá-los na fé, fé em Cristo vivo que habita em vocês; vim também para confirmá-los no entusiasmo da fé de vocês” (Saudação na Acolhida dos Jovens).

Olhando para a normalidade do Papa Francisco, esta “primavera” do século XXI, somos convidados a mergulhar na normalidade da vida para encontrar aí, diante do amor ofertado aos outros, o extraordinário do existir.

Obrigado, Papa Francisco!

Fonte: https://www.pucpr.br/identidade-pucpr/francisco-o-papa-normal-que-encontrou-o-caminho-do-coracao/

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