Por Dani Moscatelli
Durante os últimos anos, tornou-se cada vez mais evidente um padrão silencioso, porém devastador, que assola empresas de tecnologia de diferentes portes e setores: o vício em reatividade.
Esse comportamento se manifesta na priorização constante do curto prazo, no atendimento urgente de demandas emergenciais e na gestão de crises como rotina operacional. A imagem é clara: líderes correndo entre incêndios diários, profissionais sêniores dedicando sua energia a corrigir falhas que poderiam ter sido evitadas, e times inteiros operando como linhas de produção de tickets. No papel, tudo parece estar funcionando. Na realidade, a organização está parada, apenas ocupada demais para perceber.
Esse é o paradoxo da produtividade reativa.
A falsa segurança de manter o sistema funcionando
Ao colocar a tecnologia e os times de desenvolvimento como único centro de gravidade das operações, muitas empresas acreditam estar garantindo sua continuidade. O raciocínio é lógico, mas superficial: se a plataforma está no ar, os fluxos estão rodando e as integrações respondendo, então estamos no caminho certo.
O problema é que inovação e competitividade não se medem apenas por uptime ou volume de entregas. Elas são determinadas pela capacidade da empresa de antecipar mudanças, criar valor contínuo para o cliente e diferenciar-se num mercado em constante evolução. E, para isso, é preciso tempo, espaço e investimento em inovação, tudo aquilo que a reatividade crônica impede.
Os dados confirmam: estamos priorizando o presente e sacrificando o futuro
Segundo projeção da Gartner, os gastos globais com TI devem ultrapassar US$ 5,74 trilhões em 2025, com um crescimento de 9,3% em relação a 2024. A maior parte desse investimento, no entanto, está concentrada em infraestrutura, manutenção e suporte operacional, não em inovação estratégica.
De forma complementar, a Forrester prevê que 66% dos gastos em tecnologia em 2025 serão destinados a software e serviços. Ainda assim, muitas empresas não aproveitam esse potencial para criar experiências transformadoras. Elas seguem alimentando ecossistemas complexos, empilhando camadas técnicas sem resolver os problemas centrais de seus usuários.
O resultado é um crescimento desbalanceado, onde o investimento aumenta, mas o valor percebido pelo cliente não acompanha o ritmo.
Inovação como promessa vazia
De acordo com a PwC, 49% dos líderes empresariais afirmam que a inteligência artificial foi integrada à estratégia central de suas empresas em 2024. Contudo, o mesmo estudo indica que apenas uma fração dessas empresas desenvolveu mecanismos para medir o impacto real dessas iniciativas na experiência do usuário ou no diferencial competitivo.
Ou seja, a inovação é verbalizada, mencionada em apresentações e relatórios de stakeholders, mas segue sem estrutura, processo ou governança real. A cultura reativa consome tudo que tenta emergir como novo.
O impacto silencioso sobre talentos estratégicos
Profissionais de design, pesquisa, inovação e estratégia são frequentemente os primeiros a sentir o peso desse ciclo. São vistos como “custos”, não como multiplicadores de valor. Suas demissões acontecem silenciosamente, sob o argumento de “foco no core”.
Mas o que é core, senão o valor entregue ao cliente? E como entregar valor sem compreender o cliente, sem desenhar soluções que façam sentido, sem escutar o mercado?
As empresas que demitem estrategistas em tempos difíceis são as mesmas que, meses depois, contratam consultorias para resolver os problemas que esses profissionais poderiam ter prevenido.
Como quebrar esse ciclo?
1. Instituir governança de inovação.
Crie processos claros para garantir tempo, equipe e orçamento dedicados à experimentação, validação e aprendizado. A inovação não pode depender da agenda vaga da semana.
2. Reequilibrar o foco.
Times de desenvolvimento precisam ser fortalecidos, mas não isolados. A tecnologia é meio, não fim. Conectá-la a áreas como design (UX), pesquisa, CX e dados garante uma entrega mais relevante e holística.
3. Medir o custo da reatividade.
Incorpore métricas que evidenciem o preço de viver apagando incêndios: churn, retrabalho, perda de talentos, redução da taxa de inovação e aumento da frustração interna.
4. Investir em diagnósticos externos.
Consultorias de inovação podem ajudar a identificar gargalos e estruturar rotas de equilíbrio entre a operação e a visão de futuro.
O que está em jogo não é apenas eficiência, é sobrevivência
Já acompanhei empresas promissoras perderem espaço no mercado por insistirem em manter tudo como está. Já vi plataformas “funcionais” afundarem por entregarem experiências desconectadas da realidade do usuário. E testemunhei times brilhantes serem diluídos pela miopia estratégica.
Empresas que enxergam inovação como “luxo de tempo bom” costumam descobrir tarde demais que estavam sentadas sobre a fonte do seu próprio colapso.
Conclusão
O futuro não emerge como resíduo das agendas operacionais. Ele é deliberadamente construído por organizações que têm clareza de propósito, estrutura para sustentar suas escolhas e coragem para priorizar o que realmente move o ponteiro estratégico.
Tratar a inovação como um custo é negligenciar sua natureza essencial: ela não é um acessório do crescimento, mas a engrenagem central da relevância e da longevidade empresarial.
A questão não é ampliar o volume de entregas, mas elevar a qualidade das decisões. Não se trata de reagir com eficiência, mas de agir com visão.
Mais do que extinguir crises recorrentes, é preciso desativar os mecanismos que as perpetuam. O verdadeiro diferencial competitivo não está na velocidade de resposta, mas na capacidade de antecipação.
Empresas que compreendem isso deixam de correr atrás do tempo e passam a liderar a construção do futuro.
Referências
Gartner. IT Spending Forecast 2024–2025.
Forrester. Global Tech Spend To Surpass $4.9 Trillion in 2025.
PwC. AI Business Strategy Predictions.
TechRadar. Global IT Spending to Surpass $5.43 Trillion in 2025.
Reuters. EU Approves €403M to Boost Medical Device Innovation.
The Times. US Tech Firms Plan $300B+ in AI Infrastructure Investments.
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Dani Moscatelli
Founder na Phoenix Lab | Conselheira Anjo na PUC Angels
Especialista em Service Design Thinking, UX, Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação com IA