Por Enio Klein
O avanço da inteligência artificial gera simultaneamente temor e entusiasmo. O receio de substituição da força de trabalho convive com a expectativa de ganhos em produtividade, agilidade e eficiência. No entanto, o verdadeiro potencial da IA nas organizações está em sua capacidade de ampliar, e não substituir, as habilidades humanas. Ao capacitar profissionais para utilizar ferramentas de IA, as empresas promovem autonomia, adaptabilidade e fortalecimento do capital humano.
A adoção da IA exige uma mudança cultural que vai além da tecnologia. Um exemplo prático disso está na área de recrutamento e seleção. Anteriormente, currículos eram entregues fisicamente em agências, formando pilhas que dificultavam a triagem eficaz. Muitos candidatos qualificados eram ignorados simplesmente porque o volume era excessivo para análise manual. Atualmente, com candidaturas digitais, empresas podem receber milhares de currículos em pouco tempo. Com o apoio da IA, é possível identificar e priorizar perfis aderentes às vagas, tornando o processo mais ágil e preciso. Além disso, a IA monitora todo o ciclo de recrutamento, gerando dados como número de candidatos, etapas vencidas e taxas de aprovação. Mesmo com o uso de sistemas ATS (Applicant Tracking System), a presença humana segue essencial: recrutadores mantêm o foco em um processo humanizado, baseado em empatia e escuta ativa — aspectos que nenhuma máquina substitui.
O Projeto de Lei Federal nº 2338/2023 propõe uma estrutura legal robusta para o uso ético da IA. Entre seus pilares, destacam-se o direito à informação, à contestação de decisões automatizadas, à não discriminação e à supervisão humana. A legislação também classifica os sistemas de IA conforme o grau de risco, impondo maiores exigências àqueles com maior impacto social, como sistemas utilizados em saúde, crédito, justiça e segurança pública.
Nos âmbitos estaduais, o Paraná instituiu o Plano de Diretrizes de Inteligência Artificial (PDIA/PR) através da Lei nº 22.324/2025. A legislação define diretrizes para o uso da IA na administração pública, com foco em ética, transparência, capacitação de servidores e parcerias com o setor privado. Ao criar um ambiente regulatório e operacional seguro, o estado busca garantir benefícios sociais e minimizar riscos estruturais.
No mesmo sentido, a Lei Complementar nº 205/2025, do Estado de Goiás, estrutura uma política de inovação baseada em IA aberta, sustentabilidade, inclusão produtiva e governança colaborativa. Entre seus princípios, destaca-se o incentivo à capacitação técnica, à transparência, à ética e ao estímulo à participação da sociedade civil na formulação de políticas públicas.
Esses modelos legais revelam um ponto central: a inteligência artificial deve ser compreendida como ferramenta a serviço do ser humano. A legislação não apenas busca controlar excessos, mas sim promover o uso responsável e estratégico da IA para gerar inovação, equidade e desenvolvimento sustentável.
A revolução real, portanto, não reside na substituição de pessoas por máquinas, mas no uso inteligente da IA para ampliar as capacidades humanas. Governos e organizações que entenderem isso estarão mais preparados para um futuro em que o valor humano, potencializado pela tecnologia, será o principal diferencial competitivo.
Por fim, é essencial destacar que o regramento e a regulamentação da IA não representam censura ou limitação à liberdade de expressão, nem conflitam com a inovação. Pelo contrário, são o alicerce necessário para criar um modelo de equilíbrio entre os interesses das organizações e da sociedade. A regulação estabelece um ambiente juridicamente seguro e confiável — tanto para negócios quanto para a vida cotidiana — reduzindo o temor das pessoas e promovendo a adoção consciente da tecnologia. Essa é a essência da regulação: garantir que o avanço tecnológico ocorra com ética, segurança e benefícios amplamente distribuídos, fortalecendo a inovação com responsabilidade.