Por Douglas Borges Candido Coordenador do Instituto l´Hermitage de Estudos Avançados da PUCPR
Muitos se escandalizam quando tomam conhecimento de que aqueles que resolvem consagrar suas vidas à Deus também podem colaborar com a ciência. Talvez esse sentimento seja suscitado por um pouco de desconhecimento da história ou até por uma interpretação apressada das relações entre a Igreja católica e a Ciência. Mas uma coisa é certa: a vasta tradição e envergadura intelectual dessa Instituição é algo a ser celebrado no mundo contemporâneo.
E quando falamos da relação entre ciência, cultura e fé necessariamente precisamos passar pela contribuição que a Companhia de Jesus concedeu e ainda oferece ao mundo. De personalidades que vão de matemáticos à físicos, astrônomos, paleontólogos, químicos, teólogos e filósofos, os jesuítas também contam, agora, com um papa. Mas antes de falar de Francisco, gostaria de citar o Observatório do Vaticano – uma instituição que proclama a importância e as contribuições dessa congregação religiosa.
Como comenta o Padre Sabino Maffeo, SJ, no livro Os céus proclamam: astronomia no Vaticano, organizado pelos pesquisadores jesuítas do respectivo Observatório: “A specola Vaticana (o Observatório do Vaticano) tem sua origem ligada a duas diferentes linhagens astronômicas patrocinadas pela Igreja. Astrônomos do Vaticano participaram da reforma gregoriana do calendário em 1582, e o Vaticano continuou a apoiar a astronomia como parte da Santa Sé, com algumas idas e vindas, pelos 300 anos seguintes. Enquanto isso, outras pesquisas astronômicas foram iniciadas pelos jesuítas do Colégio Romano na época de Galileu” (MAFFEO, 2023, p. 62). Resumindo quase 500 anos dessa belíssima história, nas últimas décadas esse espaço constitui-se como um centro de referência para a comunidade acadêmica – não apenas pelas descobertas e estudos que realizam, mas por contribuírem com essa busca por compreender a nós mesmos.
E o olhar para os céus nos traz de volta à Terra, nos enraíza, nos reconecta e nos interliga com a nossa Casa Comum. E aí vemos a presença marcante do Espírito Santo agindo na história humana por meio das inúmeras mensagens de Francisco em torno da necessidade de transformarmos a forma como pensamos e nos relacionamos com o meio-ambiente. Um dos documentos marcantes nesse sentido é sua Encíclica Laudato Sì, onde o pontífice nos aponta para a necessidade de redespertarmos nossa consciência ecossocial. A natureza está adoecida, afirma Francisco. E como qualquer outro ser vivo nessa condição, precisamos nos atentar a isso e cuidar dela.
Um papa que, seguindo a tradição do Ensino Social da Igreja, também propôs repensarmos os sistemas econômicos que não apenas continuam perpetuando a degradação da nossa Casa Comum, mas que atenuam o fosso entre as desigualdades sociais. Que todos tenham vida e vida em abundância, diz o Evangelho de João. Sob essa tônica, Francisco convocou, em novembro de 2020, na cidade de Assis, um Congresso Internacional para tratar desse tema com jovens economistas e empresários.
Um papa que teve a sensibilidade de reconhecer a precariedade das condições de muitos educadores, no mundo todo, e perceber que é preciso envolver toda a sociedade em torno de um novo pacto em prol da educação. Um novo paradigma educacional que reconcilia a mente, o coração e as mãos – o pensar, o sentido e o agir, e coloque a pessoa no centro dos processos. Como nos recordava a sabedoria africana “Para bem educar uma criança é preciso uma aldeia inteira”. Trata-se de um comprometimento de todas as partes, sociedade civil, poder públicos e representantes políticos…todos juntos atuando em prol dessa transformação.
Um papa com um apreço sem limites pelos jovens, pois neles enxerga um potencial gigantesco de transformação social. Eles são o futuro que está plantado no presente. O que aqui fizermos repercutirá. Que o nosso antropocentrismo desmedido não impeça os jovens de sonhar com um mundo melhor, mais justo, igualitário e inclusivo.
Esse foi Francisco, um homem que redespertou sonhos e esperanças na Igreja e na sociedade. E a quem prestamos nossa homenagem.
Fonte: https://www.pucpr.br/identidade-pucpr/servo-de-deus-e-construtor-de-um-mundo-melhor/