Introdução
– Teixeira Júnior
Imagine que você é um estudante ou pai de uma criança em 2025 com um monte de promessas de IA, aplicativos e soluções que muito prometem mas ainda são, apenas, promessas.
Na sala de aula, um aplicativo de IA adapta as lições ao ritmo dos alunos, enquanto o professor é impelido a usar ferramentas digitais para corrigir tarefas em tempo real e fornecer feedbacks e relatórios.
Fora da escola, o mercado de trabalho, por sua vez, passa a exigir competências em novas tecnologias para resolver problemas complexos. Assustador? Bem, esse é o cenário atual, moldado pelo avanço da inteligência artificial (IA), mas que nem todos os países estão se adaptando a ele de forma equitativa e que já bate às portas das escolas de educação básica do Brasil.
Este texto explora as abordagens de diversos países, com reflexões de um profissional com 29 anos de experiência em educação, e oferece recomendações para o Brasil.
Você sabe o que é alfabetização (letramento) em IA?
Bem, trata-se da capacidade de compreender, interagir e tomar decisões críticas diante de tecnologias baseadas em inteligência artificial.
Envolve entender como funcionam algoritmos, reconhecer os limites éticos das máquinas, interpretar resultados gerados por sistemas automatizados e usá-los de forma segura, responsável e transparente — competências essenciais para qualquer cidadão do século XXI.
Indicadores Globais: OCDE & PISA
OCDE: Tendências que Moldam a Educação 2025
O relatório Trends Shaping Education 2025 da OCDE destaca como IA, internet das coisas (IoT) e realidade virtual já estão transformando a educação. Ele enfatiza a necessidade de habilidades adaptáveis, como pensamento crítico, resiliência, ética em IA e segurança digital.
A OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) traz estudos que indicam que 80% da população da UE precisa ter alfabetização digital básica até 2030, refletindo a urgência de integrar IA na educação, um desafio muito mais político para países que, como o Reino Unido, têm encarado de frente como prioridade.
PISA 2029: a Alfabetização Midiática em IA
O PISA (Programme for International Student Assessment), edição de 2029, sinalizou que vai introduzir a Alfabetização em Mídia e Inteligência Artificial (MAIL), buscando saber como jovens de 15 anos usam tecnologias digitais de forma crítica e ética.
O MAIL (Media and Artificial Intelligence Literacy), deve avaliar se os estudantes:
- Entendem como ferramentas de IA funcionam, como sistemas de recomendação em redes sociais.
- Reconhecem o papel humano em decisões baseadas em algoritmos.
- Analisam os impactos éticos da tecnologia, como vieses em IA.
- Colaboram e se comunicam usando plataformas digitais.
As habilidades digitais serão desenvolvidas por meio de cenários realistas, semelhantes aos utilizados na edição mais recente da Olimpíada Nacional de Inteligência Artificial (ONIA).
Um exemplo prático é a análise da confiabilidade de uma notícia online, promovendo o uso crítico da informação. O PISA 2029 já sinaliza essa mudança de paradigma, ao considerar que competências digitais são tão essenciais quanto ler, escrever e calcular para preparar os jovens para um mundo cada vez mais conectado.
Você acha que os jovens estão prontos para esse futuro digital? Participe da discussão!
A seguir, o gráfico elaborado a partir de dados da OCDE (PISA, PIAAC e Adult Literacy and Lifeskills Survey) revela uma tendência preocupante: o declínio contínuo no desempenho em testes de raciocínio e resolução de problemas em países de alta renda.

Entre os adolescentes, observa-se uma queda significativa nas pontuações médias em Matemática, Leitura e Ciências desde 2012, com destaque para Matemática, que apresenta a maior queda até 2022. Já entre os adultos, tanto a alfabetização quanto a proficiência numérica também demonstram queda constante nas últimas décadas, sugerindo que os desafios na formação de habilidades cognitivas não se restringem à educação básica.
Esses dados reforçam a urgência de repensar os currículos, metodologias e políticas públicas, priorizando o desenvolvimento de competências cognitivas complexas, pensamento crítico e resolução de problemas — habilidades indispensáveis para enfrentar os desafios de um mundo cada vez mais automatizado e interconectado.
Implementação de IA no Currículo
Modelos Internacionais e Brasil
China – Estratégia Nacional já na Educação Básica
A China, com seu plano de IA lançado em 2017, investe na educação desde o ensino fundamental, visando liderança tecnológica global. O país planeja criar 50 centros de IA e formar 5.000 alunos e 500 professores até 2025, integrando IA em disciplinas como matemática e ciências. Um exemplo desse projeto é o Smart Bin, lixeiras inteligentes que ensinam sustentabilidade e lógica de programação aos alunos, unindo tecnologia e cidadania.
O país investe massivamente na formação de talentos desde a base, com metas ambiciosas em:
- Criar 50 centros interdisciplinares de IA e 50 currículos escolares padronizados para educação em IA.
- Formar 5.000 alunos e 500 professores em IA até 2025.
- Integrar a IA em disciplinas fundamentais como ciências naturais, matemática e programação.
- Investir ¥1 trilhão (~US$ 145 bi) em IA até 2030.


- Lições da China para o Brasil: O Brasil pode adotar projetos interdisciplinares como o Smart Bin, usando materiais recicláveis para ensinar IA em escolas com poucos recursos. Isso conecta tecnologia a problemas locais, como gestão de resíduos, engajando estudantes. Como sua escola pode criar projetos assim? Compartilhe ideias!
Índia: IA para Todos
A Índia, com sua estratégia “AI for All”, usa IA para inclusão, focando em educação, saúde e agricultura. A plataforma iGOT Karmayogi, uma ferramenta online de capacitação, treina professores e jovens em habilidades digitais, disponível em várias línguas regionais.
A Índia incentiva estudantes a criar soluções para desafios locais, como apps de saúde, combinando tecnologia e impacto social.
- Lições da Índia para o Brasil: Criar uma plataforma em português, inspirada na iGOT Karmayogi, pode capacitar professores e estudantes brasileiros, mesmo em áreas rurais. Programas gamificados, como os da ONIA, podem replicar esse modelo, incentivando soluções para problemas locais.
Voltada à capacitação de servidores públicos, a iniciativa iGOT Karmayogi representa um exemplo de política pública educacional alinhada à redução das desigualdades digitais. Embora enfrente desafios semelhantes aos do Brasil, a Índia tem avançado com maior coesão institucional e alinhamento estratégico.
União Europeia – Regulação Ética e Governança
A União Europeia, com o AI Act de 2024 (lei que regula o uso de IA), prioriza ética e segurança. Sistemas de IA em escolas devem evitar vieses, garantir supervisão humana e ser transparentes. Embora isso proteja os alunos, pode limitar pequenas escolas com poucos recursos.
- Lições da UE para o Brasil: O Brasil pode criar regras éticas simples, baseadas no AI Act, que incentivem inovação sem sobrecarregar escolas. Por exemplo, diretrizes para proteger dados dos alunos podem ser aplicadas a ferramentas como a ONIA. Você acha que ética em IA é uma prioridade na sua escola? Debata!
Estados Unidos – Liderança tecnológica com foco descentralizado
Os EUA adotam uma abordagem descentralizada, onde estados, distritos escolares e grandes empresas de tecnologia lideram iniciativas de IA educacional.
Programas como AI4K12 e parcerias entre universidades e edtechs promovem currículos modulares voltados ao ensino de IA desde o ensino fundamental. O país também se destaca na produção de materiais de código aberto e na formação de professores, mas carece de uma política nacional coesa, o que pode gerar disparidades significativas entre redes públicas e privadas.
A seguir, um gráfico complementar mostra que o Brasil alcançou apenas 379 pontos em matemática no PISA 2022, ficando bem abaixo da média da OCDE (472) e distante dos países líderes, como Singapura (575).
Esse desempenho, aquém do nosso potencial, evidencia a urgência de fazermos as adequações curriculares já pensando na integração entre matemática, pensamento computacional e competências digitais, preparando nossos estudantes para os desafios da inovação, da tecnologia e de uma economia cada vez mais orientada por dados.

Regulamentação da IA
É preciso, além dos pontos mencionados acima, compreender os impactos da regulamentação da inteligência artificial na educação.
Para isso, elaboramos um infográfico comparativo que ajuda a visualizar como diferentes abordagens regulatórias adotadas por países impactam diretamente seus sistemas educacionais, influenciando currículos, formação docente e ritmo de adoção tecnológica.

A China, com uma regulação flexível e pró-inovação, foca no crescimento técnico e estratégico, promovendo a integração curricular da IA desde os primeiros anos escolares. A Índia, com uma abordagem moderada e voltada ao emprego, prioriza acesso a oportunidades, o que se traduz em um ensino com ênfase na empregabilidade. Já a União Europeia, com diretrizes mais estritas e centradas em ética, segurança e transparência, tende a gerar currículos mais críticos, mas com ritmo de implementação mais lento.
No caso do Brasil, a regulamentação ainda está em construção, representada pelo PL 2338/2023. O país busca equilibrar inovação e ética, contando com iniciativas pioneiras como a ONIA, embora ainda não disponha de uma política pública consolidada para o tema.
Portanto, a definição de uma regulação equilibrada pode ser decisiva para transformar a IA em uma ferramenta de equidade e inovação educacional no Brasil.
PBIA: um Plano Visionário do Brasil
O Plano Brasileiro de Inteligência Artificial (PBIA), lançado em 2024 com R$ 23 bilhões, investe R$ 817 milhões em educação, incluindo:
- Sistema Gestão Presente: Usa IA para reduzir a evasão escolar.
- Tutoria Inteligente Offline: Capacita professores em matemática, funcionando sem internet.
Apesar do potencial, o Brasil enfrenta desafios: desigualdade digital, formação limitada de professores, e políticas fragmentadas. Como podemos apoiar iniciativas como a ONIA em sua comunidade? Conheça mais em www.onia.org.br.
Conhecendo melhor o PBIA
O Plano Brasileiro de Inteligência Artificial (PBIA) 2024–2028, lançado em julho de 2024 durante a 5ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, visa posicionar o Brasil como referência global em inovação e uso eficiente de IA, com um investimento total de R$ 23 bilhões em quatro anos.
O objetivo é transformar a vida dos brasileiros por meio de soluções sustentáveis e inclusivas, promovendo a soberania tecnológica e o desenvolvimento de modelos de IA adaptados à realidade cultural, social e linguística do país. A “tropicalização” da IA é essencial para evitar a perpetuação de vieses e modelos importados que não atendem às necessidades locais.
O plano inclui R\$ 817 milhões em investimentos na área educacional, abrangendo desde a formação básica até a pós-graduação, com 17 frentes de ação. No entanto, para a integração da IA no sistema educacional brasileiro, é necessário superar ose seguintes desafios bem mapeados:
- Desigualdade de infraestrutura digital entre regiões e escolas.
- Formação insuficiente de professores para adoção de tecnologias avançadas.
- Fragmentação das políticas educacionais entre os entes federativos.
- Ausência de um ecossistema consolidado de edtechs focadas em IA educacional.
- Complexidade operacional do plano, que pode exigir mais esforços do que a capacidade atual das instituições governamentais permite.
Esses desafios são reconhecidos, mas temos a capacidade de superá-los e posicionar o Brasil como líder nesse campo. A formação de professores para o uso de tecnologias avançadas, destacada por mim no Fórum de Gestores do Bett Educar em 2023, é um dos principais obstáculos, agora comprovado por dados oficiais da OCDE, sendo fundamental para a transformação digital nas escolas.
É justamente com esse vetor que estamos trabalhando para avançar e promover as mudanças necessárias para um futuro educacional mais inovador e eficiente.

Brasil, Farol no Mundo
O Brasil, apesar dos desafios estruturais que citamos, possui condições únicas para se tornar uma referência latino-americana em IA educacional. Esta oportunidade de liderança regional se baseia em algumas vantagens comparativas:
- Escala e diversidade: O tamanho do sistema educacional brasileiro, com +47 milhões de estudantes, oferece um laboratório natural para desenvolvimento e teste de soluções em diferentes contextos
- Comunidade acadêmica robusta: Instituições como USP, UNICAMP, UFPE e PUC-Rio já possuem centros de pesquisa em IA reconhecidos internacionalmente
- Experiências bem-sucedidas: Iniciativas como a ONIA demonstram capacidade de mobilização e escala
- Proximidade cultural e linguística com outros países da região, facilitando a transferência de conhecimento e tecnologia
Recomendações Estratégicas
Para concretizar este potencial, sugerimos um plano de ação estruturado em cinco pilares:
1. Marco Regulatório e Governança
Para garantir um desenvolvimento ético e seguro da IA na educação, é essencial acelerar a tramitação e aprovação do PL 2338/2023, criando um ambiente regulatório que equilibre inovação com a proteção dos direitos fundamentais. Propõe-se a criação de uma Comissão Nacional de IA Educacional, composta por representantes do MEC, MCTI, CNE e da sociedade civil, com a missão de definir diretrizes, padrões éticos e protocolos de segurança específicos para o uso da IA em ambientes educacionais.
2. Currículo e Avaliação
A consolidação da ONIA como política pública permanente deve ser acompanhada da meta de atingir 2 milhões de estudantes até 2027, com ações alinhadas à BNCC. É necessário desenvolver um currículo nacional de IA e pensamento computacional, com progressão clara desde os anos iniciais. Além disso, a inclusão de competências digitais e algorítmicas nas avaliações nacionais como o SAEB e o ENEM ajudará a mapear o impacto dessas habilidades na aprendizagem.
3. Formação de Educadores
A formação docente é a base para a transformação digital significativa. Deve-se implementar um programa nacional de formação de professores em IA, com certificação oficial, e fomentar comunidades de prática e mentoria, promovendo a troca de experiências e boas práticas. Imersões práticas em empresas de tecnologia podem atualizar os docentes sobre as exigências e tendências do mercado. Tenho alertado sobre essa necessidade desde 2021, mesmo no auge da busca por tecnologias, quando ainda se negligenciava a capacitação de gestores e professores.
4. Infraestrutura e Recursos
Nenhuma estratégia será eficaz sem uma base sólida de infraestrutura. É imperativo garantir conectividade de qualidade para 100% das escolas públicas até 2028, e estabelecer uma rede nacional de 50 centros de excelência em IA educacional, com distribuição regional equitativa. Além disso, é essencial desenvolver plataformas e recursos educacionais abertos adaptados ao contexto socioeducacional brasileiro.
5. Ecossistema de Inovação
Para impulsionar soluções de impacto, é preciso criar linhas de financiamento específicas para edtechs voltadas à IA educacional e fomentar parcerias público-privadas que levem em conta as realidades regionais do Brasil. A criação de um programa de intercâmbio internacional com países líderes em IA educacional também contribuirá para o avanço técnico e pedagógico do ecossistema nacional.
A implementação coordenada dessas ações pode posicionar o Brasil como um hub regional de inovação em IA educacional, gerando não apenas benefícios internos, mas também oportunidades de exportação de soluções e conhecimento para toda a América Latina.
Conclusão: Um Caminho para Educação com IA no Brasil
A IA está redesenhando a educação global. A China lidera com tecnologia, a Índia foca em inclusão, e a Europa prioriza ética. O Brasil, com iniciativas como a ONIA e o PBIA, tem a chance de criar um modelo único, adaptado à sua diversidade e desafios.
Apesar de desafios como desigualdade digital e políticas fragmentadas, o Brasil pode liderar a América Latina em IA educacional. Com colaboração entre setores e investimento contínuo, transformaremos a tecnologia em uma ferramenta para ampliar o potencial humano, reduzir desigualdades e formar cidadãos criativos.
“Não basta digitalizar o ensino — é preciso entender a educação para novos futuros em que as tecnologias sejam ferramentas das potências humanas.” — Teixeira Júnior

Junte-se a esse movimento! Compartilhe sua visão para a educação do futuro!ernança participativa que mobilize toda a sociedade brasileira em torno deste projeto de futuro.
Key Citations
- Ministério da Educação – Participação no PBIA
- PORVIR – A educação no contexto do Plano Brasileiro de Inteligência Artificial
- Instituto de Economia – Unicamp – O Plano Brasileiro de Inteligência Artificial: da euforia à inquietação?
- Desinformante – Conheça o Plano Brasileiro de Inteligência Artificial
- FecomercioSP – Plano Brasileiro de Inteligência Artificial é positivo, mas precisa ser aprimorado
- SciELO Brazil – Novos desafios para a educação na Era da Inteligência Artificial
Leituras Complementares
- OCDE – Trends Shaping Education 2025: Publicado em janeiro de 2025, o relatório explora como tendências globais, incluindo IA, afetam a educação, destacando a necessidade de habilidades digitais e bem-estar digital (Trends Shaping Education 2025 | OECD).
- PISA 2025: Confirmado para focar em “Aprendendo no Mundo Digital”, avaliando a capacidade de estudantes de 15 anos em usar ferramentas computacionais, com coleta de dados principal em 2025 (PISA 2025 | OECD).
- WEF – Future of Jobs Report 2025: Publicado em janeiro de 2025, prevê que 39% das habilidades atuais serão obsoletas até 2030, com 59% dos trabalhadores needing treinamento em IA, criando 170 milhões de novos empregos e deslocando 92 milhões, resultando em 78 milhões líquidos (The Future of Jobs Report 2025 | World Economic Forum).